sexta-feira, agosto 7

A Arte da Desatenção

Sabe que quando você está adiantado, tudo acontece e acaba te atrasando, né? Já cansei de ouvir a minha mãe falando "poxa vida, só porque eu estava adiantada hoje, tua tia ligou e me segurou um tempão no telefone, depois a vizinha tocou aqui e me contou sobre a vida de todo mundo, sem contar que o gás acabou..."

Então, meus horários bizarros e instáveis do serviço sempre acabam gerando algum atrito com outros horários meus, mas isso já virou rotina. E, claro, hoje não poderia ser diferente.
Iria sair às 16h15 e tinha dentista marcado pras 17h30. Beleza. Acontece que pra chegar lá eu costumo levar, no máximo, 15 minutos, então eu tava bem relaxada com isso. Teria que esperar um bocado até ser atendida (e justo hoje eu esqueci de colocar um livro na mochila pra passar o tempo mais rápido), mas tudo bem. Detalhe que meu horário foi mudado pras 17h30 porque um outro dia eu cheguei quase meia hora atrasada (maldito ônibus que se recusou a passar naquele dia! Mas também, era uma coisa meio ninja: eu estava saindo às 16h45 pra consulta que era 15 minutos depois), mas isso não é relevante.

Voltando ao dia de hoje, deu as 16h15 mas eu não estava muito animada a sair e ficar um tempão esperando sem fazer nada. Decidi terminar umas coisa por lá até umas 16h30 pra depois ir embora. Continuava cedo - bem cedo - só que seria mais proveitoso dar umas voltas em algum lugar do que continuar por lá.
Pois bem, saí e fui para o ponto de ônibus. Milagre que passaram uns 5 ou 7 ônibus seguidos, só que nenhum me servia. Estranho porque de, sei lá, 10 linhas de ônibus que passam lá, umas 4 me serviriam e as outras iriam para lugares bem distintos. Esperei, esperei mais um pouquinho até que passou um lá com o letreiro que eu esperava. Dei sinal, subi, sentei e desliguei da vida.
Vira uma rua aqui, vira outra ali, sobe ladeira... O caminho que costumava ser rápido começou a demorar e, o pior, eu não reconhecia nada! Não que isso seja muita novidade, eu sou uma completa perdida, total turista no meu próprio bairro (embora aquele não fosse o meu bairro, mas não justifica), mas pelo menos uma loja ou outra, um ponto de referência aqui outro ali eu reconheço. Até que finalmente eu levantei e fui falar com o cobrador:
- Amigo, esse ônibus aqui não vai pro Tucuruvi não, né? - porque a essa altura eu já tinha certeza que estava no ônibus errado.
Nem preciso dizer que ele quase riu da minha cara. Pelo menos ele foi bem prestativo (embora tenha dado uma boa ênfase na parte de dizer que eu estava indo pro completo oposto) "mas se você precisa ir pro metrô, pode continuar nesse que vai pro Metro Belém", mas acontece que eu precisava ir para o Tucuruvi em si, e não pro metrô. E detalhe que o Belém fica aqui, o Tucuruvi fica lááááá do outro lado. E então, ele foi me salvando "faz assim, você desce no próximo ponto, atravessa a rua e pega o ônibus XY-777; aí você desce na rua Pompeu Pompilho Pomposo e pega o ônibus Z-044 que aí sim você chega no Tucuruvi" e ainda falou pro motorista "companheiro, abri aqui pra mocinha descer" e repetiua s instruções "olha, naquele ponto ali, em frente a padaria, você pega o XY-777, desce na Pompeu Pompilho Pomposo e depois pega o Z-044" e lá fui eu, esperar o XY-777 em frente da padaria.
Detalhe que estava aquele maldito sol de fim de tarde, eu toda de preto e com blusa de manga comprida (maldito uniforme!), parada num ponto de ônibus que ficava em frente de uma padaria, repleta de bêbados, do lado de um carrinho de churrsco com a melhor carne de gato siamês. Sorte que o tal ônibus não demorou a passar, mas pra minha sorte, estava mais cheio do que o inferno.

E vou aproveitar pra reclamar mais uma vez dos malditos microonibus. Aquilo é a pior invenção dos últimos tempos, cara! Não cabe nem metade das pessoas que caberiam num ônibus comum, e parece que cada dia que passa mais ônibus são substituídos por suas versões em miniatura. Foda que agora também proibiram os fretados de circular, daí já viu.

Subi no microcoletivo, perguntei pro motorista logo de cara "passa na Pompeu Pompilho Pomposo?" "passa, mas só dois pontos". Tudo bem, o que importa é que passa e essa rua eu conhecia. De nome, mas conhecia.
E lá fui, prestando bastante atenção em todas as placas (pelo menos isso...) e foi aí que eu me dei conta de como eu estava longe.

Se o cobrador daquele primeiro ônibus (que era um microonibus também. Tô dizendo, isso tá virando praga!) estiver lendo agora, valeu mesmo pela ajuda. Acho que eu estaria perdidona até agora sem a sua ajuda.
Vira aqui, vira ali e finalmente cheguei na Pompeu Pompilho Pomposo. Dei o sinal e desci. Pra minha quase total surpresa, eu continuava sem ter a menor ideia de onde estava. A única diferença é que eu sabia o nome da rua e sabia que a avenida que eu conhecia ficava perto dela (só falta saber a direção). Fui até um estabelecimento (que eu não consegui identificar se era uma papelaria vazia, um lugar pra tirar xerox, uma delegacia disfarçada ou o quê) e perguntei pra mulher como eu chegava na tal rua que eu conhecia, porque de lá eu saberia me orientar e, claro, eu já tinha esquecido qual era o ônibus que o cobrador tinha dito pra eu pegar. "Olha, você pode ir por dois caminhos..." aí já complicou, porque certamente ela explicaria os dois, eu escolheria um, esqueceria do resto da explicação quando eu estivesse na metade do caminho e iria parar em outra cidade. Então já perguntei logo o que me interessava "tem algum ônibus que vai pro Tucuruvi?" "você quer ir pra onde, afinal?", agora a coitada já estava confusa achando que eu sofria de algum distúrbio mental. Dei uma explicada rápida pra moça, que me indicou o que fazer "naquele ponto ali passam dois ônibus que vão pra lá. Um paára em frente do metrô, o outro na rua de cima. O que para em frente é o WW0, o outro é o..." "não, não, só esse tá bom. Porque se eu pegar o outro é bem capaz de eu me perder outra vez, e aí já viu... Hehe, brigada, moça".
Mal cheguei no ponto, o tal do WW0 parou e eu subi. Dessa vez, me certifiquei de olhar a plaquinha informativa do lado de fora antes de entrar, e agradeci imensamente o fato de hoje em dia termos Bilhete Único, que te permite circular por duas horas sem pagar uma nova passagem. Imagine se isso tivesse sido na época dos passes de papel...
Desce rua, cruza semáforo e finalmente eu reconhecia o lugar. Dei tantas voltas pra chegar no mesmo ponto em que tudo tinha começado, e só então comecei a tomar o caminho que deveria ter pego há quase uma hora atrás.
De super adiantada passei para em cima de hora. Se mais algo desse errado, estaria uber atrasada.
Sorte que todos os ônibus passaram rápido, mal chegava no ponto ele já virava a esquina. Se eles resolvessem demorar, tava na merda, certeza.

Felizmente, cheguei na destinação final. Atravessei o metrô por dentro, só pra cortar caminho, atravessei a rua, depois a outra e cheguei. Olhei no relógio e ainda consegui estar cinco minutos adiantada.

Na volta, conferi várias vezes se estava no ônibus certo (ainda mais que passam dois com o número igual mas com nomes diferentes, e que um faz o caminho de ida e o outro de volta, mas cruzam exatamente nesse ponto), e cheguei em casa tranquilamente.
Curioso que na ida, com todos esses eventos, o percurso foi mais rápido do que na volta.
É por isso e por tantas outras que prefiro o metrô.

E que maldito trânsito!